20 de junho de 2016

Amazzoni: Storie della progenitrice. Marra, Cremonesi e Venâncio (Passenger Press)

Tal como havia ocorrido com Racconti indiani, este pequeno livrinho faz parte dos muitos projectos da Passenger Press que tira partido de toda uma possibilidade de colaborações cruzadas entre idealizadores, argumentistas, designers e artistas. Inscrevendo-se no campo da fantasia heróica, que o autor português Ricardo Venâncio tem explorado ao longo da sua carreira (e esperam-se notícias de mais do seu trabalho este ano), encontramos aqui a sua arte empregue num território que lhe é mais familiar, logo mais completo. Tal qual esse caso anterior, este projecto parece ser “idealizado” por Christian G. Marra, quiçá no delinear basilar do universo narrativo e das próprias personagens, mas o argumento desta separata é repartido entre Alessandro Cremonesi e Ricardo Venâncio, se bem que haja depois uma subsequente responsabilização pelos textos e pelos desenhos por cada um dos autores respectivamente. (Mais) 

Storie della progenetrice é um suplemento autónomo a um projecto maior, e colectivo, em torno das Amazzoni, mas apenas temos acesso a esta brochura. O livro é composto por splash pages, isto é, apenas uma enorme vinheta por página, com o texto por baixo. Nesse aspecto, nada temos de inédito, quer no mundo da banda desenhada quer no da ilustração em geral. O que importa ver é qual a sua especificidade. No caso, trata-se da representação em composições icónicas e espectaculares de momentos-chave da história que é contada, e cujo resumo se poderia apresentar como sendo a origem de uma guerreira temível. É capturada em criança como escrava de uma tribo rival, que destrói a sua aldeia, para ser salva-raptada novamente por uma tribo de animais antropomórficos fantásticos, os quais a treinam como “cão de combate”. Depois da sua fuga, deparar-se-á com uma fonte fabulosa que lhe atribuirá características fantásticas, tirando delas partido para se transformar numa justiceira, e cujas aventuras parecem prometidas para o futuro. Pois como reza o fim desta história, “questa è solo una delle sue leggende” (estando as restantes no volume maior).

Algumas imagens apresentam-se como sendo apenas uma vinheta, isto é, um momento na acção, espaço e tempo da protagonista, mas outras apresentam-se de modo mais complexo, quer através de composições que concatenam elementos de vários momentos quer criando uma imagem de foro simbólico (uma floresta ominosa, a sua transformação, o seu legado).

O artista português Ricardo Venâncio está aqui num ponto de apuração maximal da sua conhecida assinatura gráfica: figuras naturalistas, com um solidíssimo trabalho de linha, texturada e prenhe de tramas e negros e, como dissemos, particularmente concentrado em imagens que funcionam como ícones isolados, momentos-chave, imagens representativas. A esmagadora maioria delas apresenta uma composição simétrica, com as personagens em questão no centro e ao alto, criando formas triangulares de hierarquias claras entre primeiros planos e fundos, acção e circunstância, âmago e suplemento. Os grandes planos, de paisagens abertas ou com edifícios misteriosos, são particularmente felizes, sem detrimento aos momentos de maior dinamismo, e cuja figuração faz recordar, ainda que haja diferenças, claro, John Buscema, sobretudo Conan ou Red Sonja, de quem Amazzoni é devedora. Não estamos perante a mesma busca por efeitos de páginas clássicas de banda desenhada, mas a verve do desenho está ao serviço de um imaginário comum. Publicado num pequeno formato, e com uma vintena de páginas, estamos perante um objecto que recorda uma banda desenhada popular de outros tempos.

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