8 de julho de 2010

The Box Man. Imiri Sakabashira (Drawn & Quarterly)

Notas de Verão 1. Introdução: uma vez que estamos cientes da tortura de fazer scroll down para a leitura de textos gigantescos (independentemente da sua consequência e características), e sofrendo o abafado calor que nos assola, seguem aqui tentativas de abordagens resumidas e concisas de quatro textos de banda desenhada.
Sakabashira é uma das grandes mas fugitivas referências da revista Garo, é um daqueles nomes que surgem de quando em vez nas entrevistas ou artigos, mas não são alvo de estudo directo dos manuais e enciclopédias da mangá, e muito menos da edição dos seus livros por plataformas mais acessíveis entre nós. Mais uma vez, o esforço da D&Q ajuda-nos a aproximarmo-nos de uma visão mais ampla da banda desenhada moderna japonesa.
The Box Man é uma viagem cinética (de novo, um dos temas que recorrentemente temos vindo a apontar – o que não deixa de ser um exercício muito fácil, esta identificação de acções lineares e fechadamente causais) de um homem na sua motocicleta, no que parece ser uma missão de entregar uma caixa algures. Nessa viagem, junta-se-lhe uma pequena criatura, entre o rato, a tartaruga e o duende, e que serve de ponto de entrada para o leitor. O espaço que se atravessa é absolutamente claustrofóbico, no sentido em que a focalização de quase toda a história nos impede de ter uma visão geral desse mesmo espaço: tratar-se-á de uma cidade ou de uma vila, como manda a lei nipónica da ficção, pós-apocalíptica, ou tão-simplesmente é já o underground, o bas fond, o transmutado mundo obscuro do crime, dos lupanares, das casas baratas de pernoitar e soba?
Há um episódio intervalar, quando o homem e a criatura ficam apeados e são obrigados a atravessar um complexo de apartamentos, no interior de um dos quais se dá um espectáculo de wrestling a que assistem sempre às escondidas. Esses combates são feitos entre toda a espécie de monstros (os Kaiju das séries japonesas heróicas de televisão, de Ultraman aos Power Rangers) e vários humanos, passando por muitas mulheres em trajes e poses que, por mais sofredoras que pareçam, não escondem a sensualidade doentia que lhes subjaz, recordando por exemplo um livro de imagens de Toshio Saeki, ou outros mestres do ero-guro. Sakabashira é também um artista activo noutras frentes, como se pode ver no seu site, e muita da sua arte figurativa bebe precisamente dessas fontes para a criação de estranhas combinações de culturas (desencadeando alianças quasi-surrealistas à la Woodring ou os autores do movimento desconexo e variado do “pop surrealism”).
A resolução final, isto é, o desvendamento do conteúdo da caixa, que é feito de modo paulatino, não é apenas absurdo, mas muito informativo em relação a uma certa tradição, ou peso cultural no Japão para com os progenitores. E isso é unido ao espaço a que chega, o objectivo máximo da "aventura": um barco imperial, abandonado nas margens de um mar, e transformado numa espécie de limbo ou aterro sinatário de espectáculos de variedades de gosto duvidoso. Há bandas de rock, dejectos de parques de diversão, bonecos gigantes de animais e outros objectos estranhos da cultura japonesa. Tendo em conta a geração a que Sakabashira pertence, perguntamo-nos se não é uma crítica velada a uma certa tradição empedernida do seu país. O que é corroborado, transversalmente, pelo sítio em que deposita o tal conteúdo da caixa: um navio ... O conteúdo? Se o posso desvendar, fá-lo-ei: o pai.

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