25 de maio de 2006

Pascin, La Java Bleue. Joann Sfar (L'Association)


Sobre a relação Pascin-personagem de Sfar e Pascin-o homem real já aqui se falou. A única diferença fulcral entre a série anterior aqui indicada e este novo livro de 74 páginas publicado tal qual é formal: Pascin. La Java Bleue é um livro a cores, de soberbas aguarelas, cuja presença se torna ela mesmo móbil da história, criando não só ambientes complexos, diversos, ricos, influenciando-se entre si, como ainda despoletando mesmo interpretações e relações que apenas as cores conseguem fazer. O trabalho de finas linhas de Sfar ora se mantém ora se dilui sob essas cores, mas no seu cômputo geral, há um mesmo estilo.
Por alguma razão, não consigo deixar de pensar, ao olhar para este novo, eroticizado e colorido Pascin, no Noa Noa de Paul Gauguin. Possivelmente dever-se-á a uma certa ambientação, a equação entre um território de artista educado na metrópole, de acordo com todos os princípios académicos, e as fugas que lhe são tornadas possíveis através dos alegres trópicos, do erotismo que as mulheres permitem (e os homens), dos violentos embates de cores: complementares, gémeas, descomprometidas, amnésicas, ébrias, rebarbativas, fauves, enfim, soltando todas as relações possíveis, transformando este livro numa sucessão de pequenos (duas, três páginas) de exercícios de expressividade.
As considerações autotélicas, que presumo não ser abuso podermos ir encontrar nidificadas na prática do próprio Sfar, também se mantêm, diluindo a inclinação narrativa clássica da banda desenhada (que aqui existe) num outro mais amplo objectivo, que tem a ver com a possível reflexão que um meio pode fazer sobre si mesmo, sem o fazer de um modo linear, redutor ou “escolar”.
O título cita uma chanson tornada famosa pela cantora Fréhel. Esse facto, por si, não é fulcral nem é assim tão importante enquanto contextualizador (já que o Pascin-real morreu em 1930 e esta canção surgiu em 1939). O que importa é o que ela representa e como torna significativa a sua relação com este livro: um tipo de dança de passos curtos e rápidos, típica das noites em branco de Paris, “de ritmo alegre” e que permite dançar “olhos nos olhos”, os nossos no do livro. Posted by Picasa

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